luns, 19 de decembro de 2022

NÉLIDA PIÑÓN E GALIZA

        Por José-Ma. Monterroso Devesa

 

       

            Oriunda de Cotobade é Nélida Piñon, quem figura como “Pinon” na guia telefónica do Río de Janeiro e que nos concedeu umha entrevista, digna de melhores interlocutores, na sua confortável residéncia do Leblon carioca. Natural e vizinha do Río, Piñon polo pai e Cuiñas pola mai, “para mim a vieira é aínda a concha peregrina de Santiago”, dinos a autora em “Finisterre”, um dos treze contos cujo título me deu a surpresa ao abrir polo índice o recém comprado “O calor das coisas” (ed. Nova Fronteira, Río de Janeiro, 1980).

            -O romance que estou fazendo agora é uma grande reflexao sobre o Brasil -comenta-nos-. E eu só pude fazer o meu personagem, o meu livro, só pude exercer essa reflexao sobre o Brasil através da história dum emigrante que deixa a Galícia com treze anos e vem para a América, para o Brasil. (Observe-se como Nélida, que chegou a morar onda nós algum tempo da sua infáncia -que ela reputa mui feliz-, e tem voltado à Galiza com frecuéncia, e entende-se perfectamente com a gente do meio rural com que fala -ela confesou nom ter alternado com a camada intelectual do país e quer fazé-lo na próxima volta-, observe-se como, por fidelidade à fala popular viciada, escreve e di sempre Galícia e case sempre gallego. O cal é resultado lógico da captaçom direita dumha realidade galega espanholizada, mais patetico ese resultado cando o afectado, procedente dumha terra onde se fala umha variante da nosa lingua comum, recorre à lingua alhea a ambos povos para nomear Galiza e o galego).

            Mas nom é esa a única referéncia galega da sua obra. Entre o pouco que aínda conhecemos da produçom de Nélida, ocupa lugar especial “Tebas do meu coraçao” (Livraria José Olympio Editora, Río de Janeiro, 1974), [novela] hoje esgotada no Brasil e que está traduzida em Espanha (1978); e que, nove anos depois, é practicamente desconhecida na Galiza, confirmando a geral falta de inter-relaçom com a pujante cultura brasileira de hoje, aínda menos familiar para o galego do que a vizinha cultura portuguesa.

            -Quando esteve na Galícia no 64, fui tomar contacto com certos aspectos dum mundo arcaico, antigo e remoto. E foi como entrar na minha casa... Eu resolvi reconstruir o caminho francês de Compostela. Depois de vinte e dois días de viagem, cheguei ao Cebreiro, essa porta tao sagrada de Galícia.E vi uma velhinha, toda de negro, conversando com outra velhinha.

            -Eu parei. (Eu sou muito curiosa, sou uma mulher que amo muito o humano) e me aproximei dela. Falava um gallego antigo (Nélida arrasta o “i”). E eu entendi tudo. E chorei de emoçao, como se estiver pisando no território sagrado das minhas origens.

            Asi se expresa. Así é Nélida Piñón. Sorriso aberto e cordialidade profunda. Inteligéncia desperta, dinamismo contagioso e palavra apaixonada dum dos grandes nas letras do Brasil, de tudo o que esta resenha parcial apenas é umha cativa mostra.

            Com ela falámos de muitas outras cousas de interese: o feitiço que sobre ela exerce o mundo céltico; a literatura brasileira de hoje -a sua originalidade e a sua variedade, a sua busca da definiçom do imenso, populoso e mágico país, ou melhor, continente das tres raças (“mágico pela sua cultura sincrética ibérica e negra, africana; e mágico pela atmosfera que a natureza irradia”)... Falámos da incomunicaçom, já aludida, com a Galiza e mesmo com Portugual; da auséncia do prémio Nobel -é só um signo- nas literaturas galego-luso-brasileiras; do compromiso do escritor do Brasil com a conciéncia colectiva do país...

 

(Revista “Escrita”, núm. 2, Dezembro de 1983. À altura, órgao da Asociación de Escritores en Língua Galega).

A entrevista tivera lugar, ano e meio antes, o 16-05-1982, e foi gravada. Aqui tomámos apenas umha parte da publicada que, ao tempo, recolhia só umha parte da gravaçom. Parece óbvio constatar que a entrevistada tivo, nas décadas posteriores, até hoje, umha projecçom de primeiro nível no Brasil, no mundo literário e tamém na Galiza.

 

 

 

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